Reflexão do Papa sobre a Epifania do Senhor

03/06/2012 18:23

Santa Missa na solenidade da Epifania do Senhor

Homilia do Papa Bento XVI

Basílica Vaticana
Sexta-feira, 6 de Janeiro de 2012

Queridos irmãos e irmãs,

A Epifania é uma festa da luz. «Ergue-te, Jerusalém, e sê iluminada, que a tua luz desponta e a glória do Senhor está sobre ti» (Is 60, 1). Com estas
palavras do profeta Isaías, a Igreja descreve o conteúdo da festa. Sim, veio ao mundo Aquele que é a Luz verdadeira, Aquele que faz com que os homens
sejam luz. Dá-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus (cf. Jo 1, 9.12).
Para a liturgia, o caminho dos Magos do Oriente é só o início de uma grande procissão que continua ao longo da história inteira. Com estes homens, tem
início a peregrinação da humanidade rumo a Jesus Cristo: rumo àquele Deus que nasceu num estábulo, que morreu na cruz e, Ressuscitado, permanece
conosco todos os dias até ao fim do mundo (cf. Mt 28, 20). A Igreja lê a narração do Evangelho de Mateus juntamente com a visão do profeta Isaías,
que escutamos na primeira leitura: o caminho destes homens é só o início.
Antes, tinham vindo os pastores – almas simples que habitavam mais perto de Deus feito menino, podendo mais facilmente «ir até lá» (cf. Lc 2, 15) ter
com Ele e reconhecê-Lo como Senhor. Mas agora vêm também os sábios deste mundo. Vêm grandes e pequenos, reis e servos, homens de todas as culturas e de todos os povos. Os homens do Oriente são os primeiros, seguidos de muitos outros ao longo dos séculos. Depois da grande visão de Isaías, a leitura tirada da Carta aos Efésios exprime, de modo sóbrio e simples, a mesma ideia: os gentios partilham da mesma herança (cf. 3, 6). Eis como o
formulara o Salmo 2: «Eu te darei as nações por herança, e os confins da terra para teu domínio» (v. 8).

Os Magos do Oriente vão à frente. Inauguram o caminho dos povos para Cristo.
Que tipo de homens eram os Magos? Os peritos dizem-nos que pertenciam à grande tradição astronômica que se fora desenvolvendo na Mesopotâmia no
decorrer dos séculos, e era então florescente. Mas esta informação, por si só, não é suficiente. Provavelmente haveria muitos astrônomos na antiga
Babilônia, mas poucos, apenas estes Magos, se puseram a caminho e seguiram a estrela que tinham reconhecido como sendo a estrela da promessa, ou seja, a que indicava o caminho para o verdadeiro Rei e Salvador. Podemos dizer que eram homens de ciência, mas não apenas no sentido de quererem saber muitas coisas; eles queriam algo mais. Queriam entender o que é que conta no fato de sermos homens. Provavelmente ouviram falar da profecia de Balaão, um profeta pagão: «Uma estrela sai de Jacob, e um cetro se levanta de Israel»
(Nm 24, 17). Eles aprofundaram esta promessa. Eram pessoas de coração inquieto, que não se satisfaziam com aparências ou com a rotina da vida.
Eram homens à procura da promessa, à procura de Deus. Eram homens vigilantes, capazes de discernir os sinais de Deus, a sua linguagem subtil e
insistente. Mas eram também homens corajosos e, ao mesmo tempo, humildes:
podemos imaginar as zombarias que tiveram de suportar quando se puseram a caminho para ir ter com o Rei dos Judeus, enfrentando canseiras sem número.
Mas, não consideravam decisivo o que se pensava ou dizia deles, mesmo pelas pessoas influentes e inteligentes. Para eles o que contava era a própria
verdade, não a opinião dos homens. Por isso, enfrentaram as privações e o cansaço dum caminho longo e incerto. Foi a sua coragem humilde que lhes
permitiu prostrar-se diante dum menino filho de gente pobre e reconhecer n’Ele o Rei prometido, cuja busca e reconhecimento fora o objetivo do seu
caminho exterior e interior.

O coração inquieto é o coração que não se satisfaz com nada menos do que Deus e é, precisamente assim, que se torna um coração que ama. O nosso
coração vive inquieto por Deus, e não pode ser doutro modo, embora hoje se procure, com «narcóticos» muito eficazes, libertar o homem desta
inquietação. Mas não somos só nós, seres humanos, que vivemos inquietos relativamente a Deus. Também o coração de Deus vive inquieto relativamente
ao homem. Deus espera-nos. Anda à nossa procura. Também Ele não descansa enquanto não nos tiver encontrado. O coração de Deus vive inquieto, e foi
por isso que se pôs a caminho até junto de nós – até Belém, até ao Calvário, de Jerusalém até à Galileia e aos confins do mundo. Deus vive inquieto
conosco, anda à procura de pessoas que se deixem contagiar por esta sua inquietação, pela sua paixão por nós; pessoas que vivem a busca que habita
no seu coração e, ao mesmo tempo, se deixam tocar no coração pela busca de Deus a nosso respeito. Queridos amigos, foi esta a missão dos Apóstolos:
acolher a inquietação de Deus pelo homem e levar o próprio Deus aos homens.
E, seguindo os passos dos Apóstolos, esta é a vossa missão: deixai-vos tocar pela inquietação de Deus, a fim de que o anseio de Deus pelo homem possa ser satisfeito.

Os Magos seguiram a estrela. Através da linguagem da criação, encontraram o Deus da história. É certo que a linguagem da criação, por si só, não é
suficiente. Apenas a Palavra de Deus, que encontramos na Sagrada Escritura, podia indicar-lhes definitivamente o caminho. Criação e Escritura, razão e
fé devem dar-se as mãos para nos conduzirem ao Deus vivo. Muito se discutiu sobre o tipo de estrela que guiou os Magos. Pensa-se numa conjunção de
planetas, numa Supernova, ou seja, uma daquelas estrelas inicialmente muito débeis que, na sequência duma explosão interna, irradia por algum tempo um imenso esplendor, num cometa, etc. Deixemos que os cientistas continuem esta discussão. A grande estrela, a verdadeira Supernova que nos guia é o próprio Cristo. Ele é, por assim dizer, a explosão do amor de Deus, que faz brilhar sobre o mundo o grande fulgor do seu coração. E podemos acrescentar: tanto os Magos do Oriente, mencionados no Evangelho de hoje, como os Santos em geral pouco a pouco tornaram-se eles mesmos constelações de Deus, que nos indicam o caminho. Em todas estas pessoas, o contacto com a Palavra de Deus provocou, por assim dizer, uma explosão de luz, através da qual o esplendor de Deus ilumina este nosso mundo e nos indica o caminho. Os Santos são estrelas de Deus, pelas quais nos deixamos guiar para Aquele por quem o nosso ser anseia. Queridos amigos, vós seguistes a estrela que é Jesus Cristo, quando dissestes o vosso «sim». E certamente brilharam para vós também estrelas menores, que vos ajudaram a não errar o caminho. Na Ladainha dos Santos, invocamos todas estas estrelas de Deus, a fim de que brilhem sempre de novo para vós e vos indiquem o caminho. Vós mesmos sois chamados a ser estrelas de Deus para os homens, guiando-os pelo caminho que leva à verdadeira Luz: Cristo. Invoquemos, pois, agora todos os Santos, para que possais corresponder sempre a esta vossa missão mostrando aos homens a luz de Deus. Amém.